segunda-feira, 6 de setembro de 2010

ZERO 7 - O melhor do "trip hop"?

Quando se fala em "trip hop", "downtempo", "lo-fi music" (ou outras classificações para músicas mais desaceleradas com elementos eletrônicos) sempre se pensa de imediato em bandas como Portishead, Massive Attack, AIR... Entretanto, uma dupla de multi-instrumentistas britânicos tem se destacado no cenário eletrônico com um trabalho diferenciado, suave e extremamente dinâmico: o Zero 7.





Após formarem-se como engenheiros de som e trabalharem em gravações de diversos artistas, Henry Binns e Sam Hardaker conseguiram através de um colega a possibilidade de remixar uma canção do Radiohead, "Climbing Up the Walls". O trabalho foi tão bem aceito que chamou a atenção de alguns produtores e outros artistas.

Já com uma boa moral, a dupla resolveu trabalhar em seu próprio álbum, lançando em 2001 o sensacional "Simple Things". Mas o grande disco dos caras estava por vir mesmo em 2006: "The Garden", sendo o 4º lançamento do grupo.

Após a utilização de diversos músicos em cada gravação (menções honrosas para as vocalistas Tina Dico e Sophie Barker), em "The Garden" Henry e Sam resolveram utilizar um time mais enxuto, contando com a maravilhosa Sia Furler e José Gonzales nos vocais, além de outros instrumentistas de altíssimo gabarito.

O belíssimo resultado já começa a ser percebido na faixa de abertura ,"Futures" uma aventura espacial embalada por uma bela melodia no piano e bons arranjos de cordas. O baixo marca presença com um som redondo, dando espaço para uma leve bateria e detalhes do teclado.

Logo em seguida, a melhor canção do disco rompe os alto falantes. "Throw it All Away" é guiada pelo uso do teclado Rhodes, com uma bateria certeira, reta, mas delicada. O destaque absoluto, não só da canção, mas de todo o álbum (e talvez da carreira do Zero 7) é a vocalista Sia Furler: extremamente carismática e bem-humorada, possui uma voz marcante, expressiva. Além de tudo, sua letras são doces, porém firmes. Nada de chororôs de pessoas solitárias e abandonadas.

É o que se pode conferir pelo restante do álbum, em faixas como a sexy "You're My Flame" e acordeônica "The Pageant of The Bizzare", em que a loirinha australiana rouba a cena, apesar do bom trabalho instrumental do grupo.

Aliás, falando de instrumental, "Seeing Things" é a prova viva de qua a música eletrônica pode ser elaborada, técnica e até mesmo virtuosa. Para quem acha que o estilo está condenado às fanfarronices tocadas nas boates da vida, pode começar a rever seus conceitos.

Já José Gonzales aparece também muito bem em passagens mais introspectivas do álbum. "Left Behind" possui somente um violão e avoz "chuvosa" do sueco. Destaque para "Your Place", em que sua suavidade mostra as caras na introdução, induzindo porém a canção para uma passagem ousada, com utilização do naipe de metais.

A produção do álbum é de altíssimo nível, requintada, agradando os ouvidos dos mais exigentes. A bateria é utilizada de maneira intrigante, com pratos bem agudos, no melhor estilo jazzístico, mas uma caixa marcante, fazendo a marcação necessária para o trip hop. A sonoridade dos teclados embasbaca. A multiplicidades dos efeitos não descaracteriza o som vívido dos Rhodes, tornando a audição confortável e prazerosa.

"Crosses", penúltima faixa do disco, é a maior demonstração da produção polida, com diversas inclusões de instrumentos e uma percussão simplesmente empolgante. O disco se encerra com "Waiting to Die" e seu ar infantil (novamente Sia mata a pau), dando um final irônico mas não menos positivo para o disco. As faixas terminam, mas não a certeza de que "The Garden" é um dos melhores trabalhos do grupo, e talvez do trip hop. O adjetivo que classifica o som do Zero 7 e o separa das demais bandas é um só: ORGÂNICO. Tenha a certeza de estar ouvindo um trabalho vivo, com instrumentos de verdade e bem tocados, tudo embalado no já hoje pouquíssimo antipático rótulo da música eletrônica.



1. Futures

2. Throw it All Away

3. Seeing Things

4. The pageant of Bizarre

5. You're My Flame

6. Left Behind

7. Today

8. This Fine Social Scene

9. Your Place

10. If I Can't have You

11. Crosses

12. Waiting to Die

domingo, 13 de junho de 2010

WOODSTOCK BRAZIL - Será que vale a pena?

Não é de hoje que surgem boatos sobre a realização de um novo festival intitulado “Woodstock”. Também não é a primeira vez que ouvimos dizer que o maior festival de rock de todos os tempos seria realizado dessa vez, não surpreendentemente, aqui no Brasil.

De fato o Brasil é um país com adeptos de todos os gêneros do rock n’ roll, já foi holofote para o mundo nas edições anteriores do Rock In Rio, e possui uma riqueza natural invejável, tornando-se no lugar perfeito para sediar tal evento.

Entretanto, o que me preocupa não é o lugar, mas sim os moldes desse suposto “Woodstock Brazil”...


Bom, todo mundo sabe o quanto a primeira edição, realizada em 1969, foi essencial não só para o mundo da música, mas para a humanidade. O festival foi o retrato de toda uma geração: jovens que sofriam com os reflexos de uma sociedade baseada na guerra, no ódio, na violência, na política questionável. A família tinha aspectos de uma hierarquia militarizada. A consciência social foi amparada em Woodstock, juntamente com uma consciência ambiental. Nada do atual “politicamente correto” de hoje, mas sim uma postura de respeito à natureza, sem negar a essência do ser humano, sem negar, sejamos claros, a busca pelo prazer.

O trinômio “sexo, drogas e rock n’ roll”, naquela época, tinha sim uma conotação e propósitos diferentes. Havia a liberdade sexual em jogo, ainda em tempos em que se separava o sexo de ganhos capitalistas, e o bombardeamento de nossas crianças com produtos (de entretenimento ou não) baseados na exploração da sexualidade.

Quanto às drogas, não faço apologia a seu uso, que fique bem claro. Mas naquela época o consumo e principalmente os entorpecentes em si, eram extremamente diferentes. Em uma possível nova edição do festival, teremos invariavelmente um consumo alto de drogas pesadíssimas, como a cocaína. Quem tem um mínimo conhecimento de seus efeitos, sabe que “paz & amor” nada tem a ver com os efeitos causados pela substancia. O uso de LSD no fim dos anos 60 representava uma expansão dos horizontes, criando uma nova forma de pensar, e consequentemente fugir do regime adotado em décadas anteriores. Não há como negar: o uso de drogas hoje incitará o público à pancadaria, algo semelhante com o que aconteceu em 99, na última edição do Woodstock.

Já em relação à música, nem há o que comparar. Para um festival que teve Santana, Joan Baez, Mountain, Grateful Dead, Canned Heat, Creedence Clearwater Revival, Janis Joplin, Jefferson Airplane, Joe Cocker, Ten Years After, os irmãos Winter e um inpirado/chapado Hendrix, as possíveis atrações do “Woodstock Brazil” soam ora pobres demais, ora como verdadeiros insultos.

Senão vejamos:

LINKIN PARK: Apesar de ser de péssimo gosto, seu primeiro álbum, “Hybrid Theory”, conseguiu aplicar uma roupagem mais acessível ao chamado “new metal”, e apresentou ao mundo um bom vocalista, Chester Bennignton. Vendeu horrores. “In the End” tocava até quando se ligava uma torradeira na tomada. Entretanto, após o 2º álbum a febre já tinha passado, demonstrando toda a mediocridade da banda. Atualmente fazem uma espécie de plágio do U2, besuntado na manteiga.



GREEN DAY: Alguém um dia cismou que a banda era boa. Alguém vendeu essa idéia. Alguém comprou.
Formada por 3 músicos extremamente limitados, o grupo ficou famoso na década de 90 com um punk rock escolar despretensioso. Até aí tudo bem. O problema mesmo foi quando tiveram a idéia de lançar um “álbum conceitual” (que Rick Wakeman os perdoe por usar tal expressão em vão), que variavam alguma letras menos estúpidas com músicas repetitivas, de no máximo 5 acordes. A MTV forçou a barra e os levou ao status de gênios. Farão um show de pouca qualidade, e devem protagonizar outra atuação lamentável, como no Woodstock 99, em que o pessoal jogava lama no palco. Se não fazem o público pensar, não podem cobrar atitudes inteligentes.


SMASHING PUMPKINS: Outra banda superestimada pela mídia. Apesar de bem mais cerebrado, o grupo comandado por Billy Corgan já teve dias melhores. Infelizmente a qualidade musical nunca foi seu ponto forte, e o visual estranhíssimo é o que chama mais a atenção. Há uma mulher na banda (péssima baixista por sinal) para dizerem que são diferentes. Talvez valha a pena pelos clássicos. Em tempos difíceis, uma escolha não muito ruim por parte da organização.



LIMP BIZKIT: Um espectro de si mesmo. Apesar de bons álbuns lançados na década de 90 e começo dos anos 2000, a banda recém reunida não tem mais nada a acrescentar. Algumas canções novas já estão na internet, e são verdadeiros plágios dos discos anteriores. Fred Durst já não é o mesmo ao vivo. Farão um show agressivo, totalmente distante da proposta do festival. Momento de alguns marginais derrubarem as barracas, ou coisa bem pior.

RAGE AGAINST THE MACHINE: A ótima banda americana seria uma boa para qualquer festival, menos para o Woodstock. É certo que também não têm nada novo para apresentar, mas os clássicos valeriam a pena. O problema é, novamente, a agressividade do som, a associação à revolta, rebelião, violência. “Paz & Amor” que nada, o negócio é “Killing in the Name”...


INCUBUS: A banda mais sem sal dos anos 2000. Sua escalação mostra mesmo qual o objetivo do festival: ganhar dinheiro, levando o pessoal de uma geração que não pôde ver os shows na época em que as bandas estavam no auge. Essa geração, que antes era formada por adolescentes que assistiam MTv, hoje possui médicos, engenheiros, advogados e dentistas, todos recém-formados. Já possuem grana para pagar um absurdo nos ingressos, mas ainda têm disposição e disponibilidade para acampar, farrear. Poucos têm família constituída, altas despesas, e compromissos 365 dias ao ano.



NOTAS POSITIVAS: As possíveis escalações de BOB DYLAN, FOO FIGHTERS e PEARL JAM podem fazer a diferença. Dylan dispensa comentários (apesar da produção estar se valendo do “hype” que ele teve na mídia, por conta de artistas chinfrins como Mallu Magalhães), e as outras duas bandas têm suas qualidades, podendo fazer shows memoráveis.

Enfim, “Woodstock Brazil” será duvidoso. Provavelmente com ingressos caros, sem consciência ambiental e sustentabilidade. Não pregará paz, e em certos momentos incitará a violência. È, de fato a chance de se ver algumas bandas. É a chance de acampar e conhecer pessoas, interessantes ou não. É a chance dos organizadores ganharem uma grana. Na balança, não acho que valha a pena. Quanto à utilização do nome “Woodstock”, acho uma piada de mau gosto, um verdadeiro desrespeito com a memória do rock, da música, da sociedade.

E você, o que acha?

sexta-feira, 9 de abril de 2010

SKIN ALLEY - Além do Jazz-Rock

Há certos sons inesperados que nos contagiam de uma forma inevitável. As melhores canções, os melhores grupos, os melhores álbuns aparecem por acaso, quando não se está procurando. Dizem que o amor é assim, aparece do nada. Sobre isso, não posso opinar. Mas quando aqueles acordes retumbam em meu cérebro, causando aquela sensação de "era isso que eu sempre quis escutar", não só posso como devo expressar minha opinião.

Procurando e remexendo em algumas velharias do fim dos anos 60 fui apresentado a essa banda que, como paixão à primeira vista, me fez perder a cabeça e trair antigos amores: Skin Alley. Esse conjunto desconhecidíssimo faz a cabeça de qualquer amante de jazz, de rock, de progressivo, de literatura, de cinema, de oxigênio...



Formado em 1969, o Skin Alley contava com músicos americanos e britânicos, fato que, por si só, já marcaria a identidade sonora do conjunto. Em 1970 lançam seu debut auto-intitulado, que conta com a excelente "All Alone" o seu maior sucesso comercial (sim, chegou a tocar nas rádios) "Living in Sin".
Em 1970 lançam o disco aqui resenhado, "To Pagham and Beyond", uma obra mais completa, mais ousada, e menos estruturada que o primeiro álbum.

"Big Brother is Watching You" abre o disco e a cabeça de quem a escuta. Para mim, a melhor do álbum e da carreira dos caras. A referência Orwelliana é densa, explícita e até certo ponto sufocante. O Grande Irmão não está presente somente nas letras, mas também no baixo hipnótico e observador de Nick Graham, que também gravou bela melodia do vocal e a gaita na faixa. O arranjo truncado e cinza nos remete visualmente a "Fahrenheit", obra cinematográfica de François Truffaut. Há espaço para todos os intrumentos darem sua deixa, com direito inclusive a barulhos de sirene, insinuando uma perseguição digna de um governo totalitário. Sinceramente, uma canção inesquecível e avassaladora.

A segunda faixa do disco segue direção diversa, enviando o ouvinte diretamente a uma selva, longe da urbanidade opressora. "Take me to Your Leader's Daughter" é uma canção que esbanja esperança, com tons romanceados. Há espaço para uma influência árabe, tornando-a a parte mais rica musicalmente de toda a gravação. A flauta de Bob James guia toda a digressão que se opera em seus 8 minutos. Aliás, o trabalho desse artista merece ser reconhecido, já que além da flauta, comanda todos os saxofones e guitarras do disco!

Mas se você acha que a variedade se esgotaria em apenas duas músicas, engano seu. A regravação do clássico de Graham Bond, "Walking in the Park", é cisuda e encorpada. O saxofone dá mais a tona do que em outras versões. Na verdade é até um pouco engraçado ouvir um R&B tocado de maneira tão sofisticada. Krzysztof Henryk Juskiewicz é o responsável pelos teclados (e também pelos trompetes) e exibe toda sua técnica e versatilidade não somente nessa faixa, mas também em "Queen of Bad Intentions", uma canção mais voltada para o progressivo, com quebras de tempos e intermináveis variações rítmicas.

Mas ritmo mesmo é o que não existe na abertura de "Sweaty Betty". Uma completa insanidade, guiada pelas bateras de Alvin Pope e Tony Knight. Uma maçaroca jazzística alcança os altos falantes, com a bela companhia do vocal de Bob James, já num ritmo mais estruturado. O disco se encerra com "Easy To Lie", que tende para uma linha mais intimista, dialogando inclusive com a música religiosa americana dos anos 60, com direito a estalares de dedos e tudo o mais. Alguns compassos soam mais animadas, como se a oração surtisse efeito em certos momentos.

Vale nota ainda a produção do disco, muito bem realizada, com efeitos interessantes para a época, como fade-in de alguns insrtumentos durante passagens mais truncadas e alterações dinâmicas no efeito estéreo. A sonoridade é característica dos anos 60, tendendo mais para a roupagem européia. Detalhe interessante é que o engenheiro de som é, ninguém mais niguém menos, que Martin Birch, que viria a se tornar o lendário produtor do Iron Maiden.

Enfim, "To Pagham and Beyond" é um disco essencial para quem gosta de música trabalhada, complexa, mas ainda acessível, sem os excessos do krautrock por exemplo.

Paixão à primeira vista? Pode ser que sim, mas pode ser que não, pois dizem que esse sentimento é passageiro. Com o Skin Alley, prepare-se para diversas viagens no tempo, no espaço e na cultura ocidental através de inúmeras audições. É impossível ouvir uma vez só.


1. Big Brother Is Watching You

2. Take Me to Your Leader's Daughter

3. Walking in the Park

4. Queen of Bad Intentions

5. Sweaty Betty

6. Easy to Lie

Link para o álbum















sábado, 5 de setembro de 2009

The Black Crowes - Lenha Para Queimar Em Pleno 2009

Quem disse que só de velharia vive o mundo da boa música? Não, ainda tem muita coisa boa sendo produzida na atualidade, apesar da mídia não dar o mínimo destaque para bandas como The Answer, Rose Hill Drive, etc.


Entretanto, o Black Crowes já foi um dos grandes destaques da música mundial, quando do lançamento de seus álbuns mais expressivos no começo dos anos 90. O mundo inteiro sabia cantar "Remedy", "Wiser Time" e "Sometimes Salvation". O problema todo veio com a bizarrice pop do meio dos anos 90 que espantou de vez qualquer coisa boa das rádios e tv's. Mas isso é assunto para outra hora.



Após o lançamento do excelente "Warpaint" em 2008, uma onda de desconfiança tomou conta dos fãs dos Corvos: um novo álbum já seria lançado um ano depois. Daria tempo de escrever canções consistentes com os do álbum anterior, que sucedera "Lions", lançado sete anos antes?


O resultado é o álbum "Before the Frost..." (que conta com uma segunda parte, "...Until the Freeze", disponível para download por quem levar a bolacha original). Um som mais sincero, mais rural, e gravado 100% ao vivo!

Um belo trabalho de produção, mixagem e masterização retirou os ruídos, intensificou os instrumentos, mas manteve a energia do palco da banda. É de se tirar o chapéu que, em plenos dias de pro-tools e outras parafernálias, que permitem qualquer taquara rachada a gravar um disco, um grupo tenha a coragem de lançar um material inédito em gravações "on stage".


Todas as canções são guiadas por melodias mais simples do vocal de Chris Robinson. Aliás, pode-se dizer mesmo que seu jeito de cantar mudou muito dos primeiros álbuns para os dias atuais. Sabe-se lá o motivo (bebedeira, drogas, ou idade mesmo), mas sua voz está mais grave, mas com um timbre muito mais acentuado, deixando todo o álbum com sua marca.

Já seu irmão, Rich Robinson, lidera o trabalho das guitarras de forma impecável, sendo também compositor da maioria das canções. É clara a influência de The Faces e bandas do gênero em seu método de criação. Vale destacar o ponto alto de sua participação na sétima faixa do álbum, "What is home": uma viagem folk, mistura de Nick Drake com Led Zeppelin, em que o próprio guitarrista comanda os vocais, acompanhado de violas e guitarras naturebas.


Falando em guitarras, Luther Dickinson, que assumiu a responsa de substituir o idolatrado Marc Ford, mostra novamente seu poder de fogo com slides precisos e exuberantes, sendo definitivamente um grande nome na guitarra sulista atual. Na primeira faixa, "Good Morning Captain", ele já mostra toda sua técnica, enquanto o rock n' roll come solto. Em "Been a Long Time (Waiting on Love)" a banda parece fazer referência a eles mesmos, numa ótima canção, mas parecida com algo que já tinham feito no passado. A quebradeira em estilo jam session dá as caras pela primeira vez, e se torna uma constante por toda a gravação. Mérito para o consagrado
batera Steve Gorman, que toca com toda verocidade e criatividade necessárias para o trabalho.


O outro componente da cozinha, Sven Pipien, criou linhas de baixo fantásticas, não só completando as composições, mas dando uma tônica interessante em faixas como "Apaloosa" e na disco-hippie "I Ain't Hiding". Essa última faixa é uma referência explícita ao trabalho solo de Rod Stewart, sendo controversa no gosto dos fãs. Particularmente, acho uma das melhores do álbum.


O disco segue com mais Black Crowes em seu estado puro: muita guitarra, vocais cheios de emoção e arranjos charmosos. O tecladista Adam MacDougall completa o time com melodias interessantes, em destaque na faixa "And the Band Played On", guiada pelo seu pianão.


"Before the Frost..." é um álbum completo, relaxante, divertido. Totalmente embebido em bandas como The Byrds (fase Sweetheart of the Rodeo) e The Faces, mas sem deixar as características do grupo fora da evidência. Pode não ser um novo grande clássico como alguns álbuns anteriores, mas mostra uma banda afiada, pronta para fazer rock n' roll de qualidade sem se preocupar com modismos e modernices que andam sobrando nesse ano de 2009. Parabéns ao Black Crowes, e que apareçam aqui em terras brazucas nessa turnê!


1. Good Morning Captain

2. Been a Long Time (Waiting on Love)

3. Apaloosa

4. A Train Still Makes a Lonely Sound

5. I Ain't Hiding

6. Kept My Soul

7. What is Home

8. Houston Don't Dream About Home

9. Make Glad

10. And The Band Played On

11. Last Place That Love Lives

Link para o álbum

domingo, 26 de abril de 2009

O SOM NOSSO DE CADA DIA - A pérola brazuca!



"Sempre muito Snegs de Biufrais..." O que isso significa eu não sei, mas é exatamente como qualquer um pretende se sentir após ser atingido pelo turbilhão sonoro da banda que, para mim, é a melhor do rock progressivo nacional: o Som Nosso de Cada Dia.



Considerados como os precursores do estilo no Brasil, o Som Nosso foi formado no começo dos anos 70, atendendo pelo nome de Cabala. Bem antes do surgimento dos Secos e Molhados de Ney Matogrosso, e de todo o bafafá que envolve até as máscaras do KISS, o Cabala adotava um visual teatral, com direito a rostos pintados e tudo mais.

Posteriormente, alteraram o nome da banda e concentraram-se mais na elaborada sonoridade que seria a principal característica do trio: um progressivão daqueles, estilo Emerson Lake & Palmer, misturado com música regional brasileira, um toque de Clube da Esquina e até pitadas de música latina. Isso tudo pode ser ouvido no classudo álbum de estréia da banda, intitulado de "Snegs".

A banda era formada por Pedrinho Batera nas baquetas e vocais, Pedro Baldanza, o Pedrão, no baixo, violão e vocal e pelo virtuosíssimo Manito (ex-Incríveis) nos teclados, piano, flauta, sax, violino e qualquer outra coisa que fazia barulho. Comentar as performances individuais de cada músico neste disco é perda de tempo. Só ouvindo para acreditar que tudo isto estava sendo feito aqui no nosso quintal, sem investimentos e sem produções rebuscadas.

A faixa de abertura, "Sinal da Paranóia" é o cartão de visitas perfeito para aquele que "busca a essência" do rock nacional. Num ritmo cadenciado, a psicodelia transborda em meio a variações melódicas intensificadas pelos vocais certeiros de Pedrinho e Pedrão. Este último dita o ritmo na surpreendente sequência, "Bicho do Mato". Canção que começa simples, em ritmo de puro rock n' roll, com letras que incomodam qualquer engravatado submerso no mar de concreto das grandes cidades, antes de embarcar em mais uma viagem sonora embalada pelo Hammond de Manito.

Comentar as letras de "Snegs" é um caso a parte. O letrista da banda era o poeta Paulinho Mastrote Machado, que acabou sendo obrigado a assinar as composições sob o pseudônimo de "Capitão Foguete", uma vez que trabalhava em uma certa editora de grande porte. Capitães à parte, este que escreve é fã incondicional do trabalho feito por Paulinho em todo o álbum: orações desestruturadas, conteúdo filosófico, reflexivo, além de ser sempre um tapa na cara da sociedade e do Estado àquela época. Acho que até hoje não encontrei letras melhores na história da música brasileira, mesmo sabendo que tal afirmação me custará algumas pedradas na testa.

A canção que leva o nome da banda é marcada pelas vocalizações inacreditáveis de Pedrinho. Aliás, que voz tinha esse cara que infelizmente nos deixou em 1994. Alice Cooper, para quem a banda abriu os shows de sua turnê tupiniquim, deve ter ficado embasbacado com a habilidade do brasileiro que tocava bateria no mais alto nível, em tempos repicados e compassos pouco convencionais, ao mesmo tempo em que se soltava agudos com toda a emoção que nenhum gringo jamais terá.

"Snegs de Biufrais" é, digamos, a balada da bolacha. Suavidade de dar inveja, num arranjo leve e polido. A poesia casa perfeitamente com a estrutura melódica, causando uma peculiar identificação no ouvinte com os dizeres: "Eu só quero beber a vida num gole só, ainda que o gole me custe a vida..." Canção para fazer qualquer um engasgar.

Mas quem não se engasgou de jeito nenhum foi Manito, que em "Massavilha" desce o porrete no Moog, provando que Keith Emerson ainda não havia feito tudo em matéria de teclado. O andamento hipnótico só é reduzido para, novamente, os exímios vocais cantaram na praça de guerra, com o contra-ataque de lições cabeça e paz-e-amor, ante a violência da repressão.

A espacial "Dirección de Aquarius", cantada em espanhol, tem a participação de Marcinha nos vocais, e é uma boa descansada para o ato final, "A Outra Face", que para este blogueiro é a melhor do disco. Um andamento quase hard, num Hammond grudado de Manito, bateria bem quebrada e baixo pulsante. Pedrinho grita tudo que pode e mais um pouco. De tirar o fôlego.

Após "Snegs", Manito foi para os Mutantes, e a banda teve sua formação alterada diversas vezes, lançando mais alguns bons álbuns, mas nada que superasse este discaço. Atualmente, mesmo com a morte de Pedrinho, a banda se reuniu para algumas apresentações e pretende lançar canções inéditas. "É preciso olhar pro infinito."

1. Sinal da Paranóia

2. Bicho do Mato

3. O Som Nosso de Cada Dia

4. Snegs de Biufrais

5. Massavilha

6. Dirección de Aquarius

7. A Outra Face

8. O Guarani*

*Esta é uma Faixa Bônus, readaptação da obra de Carlos Gomes, gravada em 1993 para o lançamento de "Snegs" em formato CD. Infelizmente, o som do teclado de Manito deixou a desejar, mas é uma interessante releitura.

Link para o álbum

sábado, 2 de agosto de 2008

COLOSSEUM - Filha(o) do Tempo

"Música boa não tem prazo de validade." Essa frase , que ouvi em um peculiar show de coisas que não posto por aqui, define exatamente como me sinto em relação à música. E também sem prazo de validade é o som desta fabulosa banda que apresento, o Colosseum.


Imagine um som orientado pelas mais diversas escalas jazzísticas, andamentos complexos, quebras de tempo e mudanças temáticas. Alie a isso um domínio completo de todo o sentimento "bluesy" britânico sessentista, um ligeiro flerte com a música popular das rádios da época e um virtuosismo inexplicável. Pronto, assim pode-se descrever o quarto, definitivo, clássico e matador álbum da banda, "Daughter of Time".

Se lançado hoje, ao invés de 1970, seria atualíssimo. Interessante como a presença de elementos clássicos e arranjos que remetem ao passado podem tornar um som moderno: tem alguma coisa de errado na música atual, mas isso é papo para outra hora...

Esse super grupo foi formado em 1968, capitaneado pelo talentosíssimo baterista John Hisemann e pelo saxofonista Dick Heckstall-Smith, ex-integrantes da banda de John Mayall. Para o teclado fora recrutado o mago das teclas Dave Greenslade, que depois veio a marcar a história do progressivo com a banda que levava seu nome. Passaram por várias formações e gravaram o também antológico "Valentyne Suite" com James Litherland na guitarra e vocais. Mas a formação definitiva veio com a entrada de Mark Clarke no baixo, Dave "Clem" Clempson (que mais tarde faria parte do Humble Pie, substituindo ninguém mais, ninguém menos, que Peter Frampton) e o monstruoso vocalista Chris Farlowe (que já havia feito sucesso como cantor pop com o hit "Out of Time" em 66, e mais tarde faria parte do Atomic Rooster).

Esse inacreditável time reunido conseguiu imprimir em "Daughter of Time" um trabalho coeso, evolutivo e variado, muitíssimo variado. Não se assuste se você se perder durante as viagens de "Time Lament", pois logo logo você volta. E é esse o grande triunfo do disco: a impressão de que está tudo ligado, que a audição tem um começo, meio e fim, mesmo com o mosaico sonoro das 7 faixas.

"Three Score and Ten, Amen" abre o disco, perdoem-me o trocadilho, de maneira "colossal": uma ambientação épica, com um tema suficientemente sombrio, guiado por uma linha melódica inacreditável do vocalista mais feio do mundo, Chris Farlowe. Não há como negar como sua entrada na banda foi positiva: suas performances são brilhantes, cheias de emoção. Sua voz peculiar surpreende, e nos tira o fôlego em notas que pouco lembram seres humanos. Destaque para sua performance também no cover de Jack Bruce, "Theme for an Imaginary Western".

Contudo, em uma das melhores músicas do disco, "Take me Back to Doomsday", quem canta é o guitarrista, Clem Clempson. Ok, sua voz não é das melhores, e a versão ao vivo dessa música, com Chris apavorando no microfone, comprova o equívoco em gravá-la. No entanto, não se pode duvidar do seu talento nas seis cordas: o homem tem inspiração de sobra, um feeling absurdo, e uma linha jazzística de encher os olhos. Não é à toa que é considerado um dos melhores guitarristas da história.

Falando em jazz, a contribuição máxima desse estilo no disco com certeza vem das proezas de Heckstall-Smith: com sua marcante característica de tocar 2 (dois!) sax ao mesmo tempo (um saxofone um sax-alto), o carequinha conseguiu imprimir características interessantíssimas, relembrando obras de décadas anteriores, e fazendo a ligação direta do estilo de new-orleans ao prog inglês. "Time Lament" e a canção que leva o nome do álbum, "The Daughter of Time", são as grandes responsáveis pela pergunta: progressivo ou jazz rock?

Mais caindo para a primeira opção temos o trabalho de Greenslade. Debulhando seu hammond, o simpático tecladista é responsável por muitas texturas, além de virtuosas passagens solo, como em "Bring Out Your Dead". Já com seu pianão de cauda, demonstra segurança em frases influenciadas pela música clássica e, como não poderia deixar de ser, pelo jazz.

Mark Clarke aparentemente entrou na banda no meio das gravações, ou coisa parecida, pois nem mesmo é o responsável pelo baixo em todas as faixas (Louis Cennamo assina a maioria). Apesar disso, o trabalho nas quatro cordas do disco é elegante, apesar de claramente complementar. Faltou algum capricho na escolha dos timbres, ou talvez maior interesse na hora da mixagem, mas nada que comprometa a obra.

"Downhill and Shadows" fecha o disco no melhor estilo blues, numa levada certeira do chefão Hisemann. Este, em todas canções, mostra porque é melhor que todo mundo na bateria: viradas espetaculares, tempos impossíveis, pegada de elefante, versatilidade... gente, tem muita, mas muita coisa além dos Mike Portnoy da vida na batera... Pra quem não acredita, a faixa bônus do disco, "The Time Machine", é uma aula de bateria do mestre.

Esse magnífico álbum merece ser ouvido com cuidado, muitas vezes. Sempre há alguma coisa nova em alguma faixa que não se havia ouvido anteriormente. Na canção título, por exemplo, sutilmente introduz-se passagens de outras canções, em arranjos diferenciados (com as flautas de Barbara Thompson, esposa de Hisemann) , mas que parecem pertencer ao todo. Conceitual? Pode ser...

Infelizmente, após um álbum ao vivo em 1971, a banda se separou. Curiosamente, em 1975, Hisemann retornou com um tal de Colosseum II (acreditem!), sem os elementos de jazz, tocando um prog-fusion cabulosíssimo. Só para constar, essa segunda encarnação tinha Gary Moore nas guitarras (!) e Don Airey (sim, atual Deep Purple!) nos teclados.

A formação clássica, contudo, retornou aos palcos em 1994, e lançou um DVD e material inédito. Infelizmente, em 2004, Dick Heckstall-Smith faleceu, e seu lugar agora é ocupado pela velha conhecida Barbara Thompson.

Mas como disse no começo do post, "música velha não tem prazo de validade". O tempo passou, a banda mudou, integrantes faleceram, mas "Daughter of Time" está novo, fresquinho, pronto para você ouvir. Se o tempo é eterno, a filha dele, em forma de música, também é...



1. Three Score And Ten, Amen
2. Time Lament
3. Take Me Back To Doomsday
4. The Daughter Of Time
5. Theme For An Imaginary Western
6. Bring Out Your Dead
7. Downhill And Shadows
8. The Time Machine (Bonus) (recorded live at the Royal Albert Hall, july 1970)


domingo, 18 de maio de 2008

MK IV Deep Purple - Venha provar a banda!



Ah o Purple... Se há uma banda que se deve dividir em fases e estudar cada uma delas com atenção é essa. Todo mundo sabe do sucesso de "Machine Head" em 1972 e o fim da segunda formação (MK II) com a saída de Ian Gillian e Roger Glover. Todo mundo também sabe que nos seus respectivos lugares entraram o já conhecido Glenn Hughes e o recém descoberto e ainda rechonchudo David Coverdale. Com a formação estabelecida (MK III) com os dois novatos e os fundadores Ritchie Blackmore, Jon Lord e Ian Paice lançaram "Burn" e "Stormbringer", e dominaram o mundo.
Após uma série de desentendimentos o genial e genioso Blackmore deixa a banda para formar o Rainbow e grita aos quatro cantos que o Purple acabou. Ah Ritchie, errou feio...




Tem se início a fase mais desconhecida (e também renegada pelos fãs ardorosos do chapeludo) da banda. Após descartarem muitas opções inacreditáveis como Dave "Clem" Clempson (ex- Colosseum) escolhem o talentosíssimo garoto de 20 e poucos anos de idade, Tommy Bolin, ex- James Gang.
O quinteto, subestimado pela mídia, lança em 1975 o disco que tenho como clássico absoluto, "Come Taste the Band".
Ok ok, o disco é diferente: muito mais "funkeado", dançante, coisa que titio Blackmore desaprovava. Mas e daí? As composições, quase que integralmente assinadas pelos não fundadores, refletem personalidade, ousadia e criatividade.
A abertura fica por conta de "Comin' Home", uma pauleira de Coverdale, Bolin e Paice, direta ao ponto, que mostra que a MK IV não estava para brincadeira. Inclusive, a performance do batera em todo disco é fenomenal, com suas características "viradas" velozíssimas e uma pegada única.
Jon Lord é o menor dos destaques na obra. Talvez a característica mais agitada das canções tenha impossibilitado o mestre de mostrar suas habilidades derivadas da música clássica como em álbuns de outrora. Mas nada o impediu de chulapar o Hammond por todo o álbum. Destaque para o solo "moogeado" de 'Love Child".
O restante das pauleiras é fruto, basicamente, de um Coverdale amadurecido, mais solto, mais beberrão, mais irresponsável. O futuro vocalista do Whitesnake solta muito mais a voz em "Come Taste..." e impressiona pela criatividade em criar linhas melódicas interessantíssimas, além das letras puramente hard rock.
Em parceria com o rei do soul/funk Glenn Hughes compôs o ponto alto do disco, "You Keep On Moving", que mostra um Purple diferente mas seguro de si, através de uma canção pesada, gritada, que contudo oscila em partes suaves, cheias de alma e balanço.
Falando em alma e balanço, o ex-baixista do Trapeze simplesmente emocionou uma geração com a oitava canção da bolacha: "This Time Around/Owed to 'G'". Indescritível, a balada vai do céu da voz e baixo de Hughes até a infernal quebradeira de Paice e Bolin ao final. Simplesmente emocionante, uma das mais belas canções da história do hard rock.
Mas o destaque deste disco fica mesmo com o jovem Tommy Bolin. Apesar de malhado pelos shows, onde alterava todos os solos de Blackmore, deixou um legado de fãs com apenas um álbum no Purple. Mostrou criatividade, ousadia ao usar de acordes "estranhos" à banda e solos inesperados. Considerado por alguns como o guitarrista mais versátil depois de Hendrix, conseguia unir elementos de boogie, hard, soul, funk e psicodelia de uma maneira muito peculiar. Largava mão de abusar do virtuosismo e esbanjava sentimento. Sofreu por ter que substituir um gênio, mas para alguns tornou-se outro. Passou vergonha no final da turnê do disco, pois teve seu braço paralisado após um pico mal dado de heroína, e mal conseguia segurar a guitarra.
O abuso das drogas, todos sabem, levou ao fim do Deep Purple em 1976, e posteriormente à morte por overdose de Tommy Bolin. Uma pena, pois a quarta formação poderia ter rendido muito mais e lançado mais petardos como este.


  1. Comin' Home
  2. Lady Luck
  3. Gettin' Tighter
  4. Dealer
  5. I Need Love
  6. Drifter
  7. Love Child
  8. This Time Around / Owed to 'G'
  9. You Keep On Moving

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