sábado, 2 de agosto de 2008

COLOSSEUM - Filha(o) do Tempo

"Música boa não tem prazo de validade." Essa frase , que ouvi em um peculiar show de coisas que não posto por aqui, define exatamente como me sinto em relação à música. E também sem prazo de validade é o som desta fabulosa banda que apresento, o Colosseum.


Imagine um som orientado pelas mais diversas escalas jazzísticas, andamentos complexos, quebras de tempo e mudanças temáticas. Alie a isso um domínio completo de todo o sentimento "bluesy" britânico sessentista, um ligeiro flerte com a música popular das rádios da época e um virtuosismo inexplicável. Pronto, assim pode-se descrever o quarto, definitivo, clássico e matador álbum da banda, "Daughter of Time".

Se lançado hoje, ao invés de 1970, seria atualíssimo. Interessante como a presença de elementos clássicos e arranjos que remetem ao passado podem tornar um som moderno: tem alguma coisa de errado na música atual, mas isso é papo para outra hora...

Esse super grupo foi formado em 1968, capitaneado pelo talentosíssimo baterista John Hisemann e pelo saxofonista Dick Heckstall-Smith, ex-integrantes da banda de John Mayall. Para o teclado fora recrutado o mago das teclas Dave Greenslade, que depois veio a marcar a história do progressivo com a banda que levava seu nome. Passaram por várias formações e gravaram o também antológico "Valentyne Suite" com James Litherland na guitarra e vocais. Mas a formação definitiva veio com a entrada de Mark Clarke no baixo, Dave "Clem" Clempson (que mais tarde faria parte do Humble Pie, substituindo ninguém mais, ninguém menos, que Peter Frampton) e o monstruoso vocalista Chris Farlowe (que já havia feito sucesso como cantor pop com o hit "Out of Time" em 66, e mais tarde faria parte do Atomic Rooster).

Esse inacreditável time reunido conseguiu imprimir em "Daughter of Time" um trabalho coeso, evolutivo e variado, muitíssimo variado. Não se assuste se você se perder durante as viagens de "Time Lament", pois logo logo você volta. E é esse o grande triunfo do disco: a impressão de que está tudo ligado, que a audição tem um começo, meio e fim, mesmo com o mosaico sonoro das 7 faixas.

"Three Score and Ten, Amen" abre o disco, perdoem-me o trocadilho, de maneira "colossal": uma ambientação épica, com um tema suficientemente sombrio, guiado por uma linha melódica inacreditável do vocalista mais feio do mundo, Chris Farlowe. Não há como negar como sua entrada na banda foi positiva: suas performances são brilhantes, cheias de emoção. Sua voz peculiar surpreende, e nos tira o fôlego em notas que pouco lembram seres humanos. Destaque para sua performance também no cover de Jack Bruce, "Theme for an Imaginary Western".

Contudo, em uma das melhores músicas do disco, "Take me Back to Doomsday", quem canta é o guitarrista, Clem Clempson. Ok, sua voz não é das melhores, e a versão ao vivo dessa música, com Chris apavorando no microfone, comprova o equívoco em gravá-la. No entanto, não se pode duvidar do seu talento nas seis cordas: o homem tem inspiração de sobra, um feeling absurdo, e uma linha jazzística de encher os olhos. Não é à toa que é considerado um dos melhores guitarristas da história.

Falando em jazz, a contribuição máxima desse estilo no disco com certeza vem das proezas de Heckstall-Smith: com sua marcante característica de tocar 2 (dois!) sax ao mesmo tempo (um saxofone um sax-alto), o carequinha conseguiu imprimir características interessantíssimas, relembrando obras de décadas anteriores, e fazendo a ligação direta do estilo de new-orleans ao prog inglês. "Time Lament" e a canção que leva o nome do álbum, "The Daughter of Time", são as grandes responsáveis pela pergunta: progressivo ou jazz rock?

Mais caindo para a primeira opção temos o trabalho de Greenslade. Debulhando seu hammond, o simpático tecladista é responsável por muitas texturas, além de virtuosas passagens solo, como em "Bring Out Your Dead". Já com seu pianão de cauda, demonstra segurança em frases influenciadas pela música clássica e, como não poderia deixar de ser, pelo jazz.

Mark Clarke aparentemente entrou na banda no meio das gravações, ou coisa parecida, pois nem mesmo é o responsável pelo baixo em todas as faixas (Louis Cennamo assina a maioria). Apesar disso, o trabalho nas quatro cordas do disco é elegante, apesar de claramente complementar. Faltou algum capricho na escolha dos timbres, ou talvez maior interesse na hora da mixagem, mas nada que comprometa a obra.

"Downhill and Shadows" fecha o disco no melhor estilo blues, numa levada certeira do chefão Hisemann. Este, em todas canções, mostra porque é melhor que todo mundo na bateria: viradas espetaculares, tempos impossíveis, pegada de elefante, versatilidade... gente, tem muita, mas muita coisa além dos Mike Portnoy da vida na batera... Pra quem não acredita, a faixa bônus do disco, "The Time Machine", é uma aula de bateria do mestre.

Esse magnífico álbum merece ser ouvido com cuidado, muitas vezes. Sempre há alguma coisa nova em alguma faixa que não se havia ouvido anteriormente. Na canção título, por exemplo, sutilmente introduz-se passagens de outras canções, em arranjos diferenciados (com as flautas de Barbara Thompson, esposa de Hisemann) , mas que parecem pertencer ao todo. Conceitual? Pode ser...

Infelizmente, após um álbum ao vivo em 1971, a banda se separou. Curiosamente, em 1975, Hisemann retornou com um tal de Colosseum II (acreditem!), sem os elementos de jazz, tocando um prog-fusion cabulosíssimo. Só para constar, essa segunda encarnação tinha Gary Moore nas guitarras (!) e Don Airey (sim, atual Deep Purple!) nos teclados.

A formação clássica, contudo, retornou aos palcos em 1994, e lançou um DVD e material inédito. Infelizmente, em 2004, Dick Heckstall-Smith faleceu, e seu lugar agora é ocupado pela velha conhecida Barbara Thompson.

Mas como disse no começo do post, "música velha não tem prazo de validade". O tempo passou, a banda mudou, integrantes faleceram, mas "Daughter of Time" está novo, fresquinho, pronto para você ouvir. Se o tempo é eterno, a filha dele, em forma de música, também é...



1. Three Score And Ten, Amen
2. Time Lament
3. Take Me Back To Doomsday
4. The Daughter Of Time
5. Theme For An Imaginary Western
6. Bring Out Your Dead
7. Downhill And Shadows
8. The Time Machine (Bonus) (recorded live at the Royal Albert Hall, july 1970)


domingo, 18 de maio de 2008

MK IV Deep Purple - Venha provar a banda!



Ah o Purple... Se há uma banda que se deve dividir em fases e estudar cada uma delas com atenção é essa. Todo mundo sabe do sucesso de "Machine Head" em 1972 e o fim da segunda formação (MK II) com a saída de Ian Gillian e Roger Glover. Todo mundo também sabe que nos seus respectivos lugares entraram o já conhecido Glenn Hughes e o recém descoberto e ainda rechonchudo David Coverdale. Com a formação estabelecida (MK III) com os dois novatos e os fundadores Ritchie Blackmore, Jon Lord e Ian Paice lançaram "Burn" e "Stormbringer", e dominaram o mundo.
Após uma série de desentendimentos o genial e genioso Blackmore deixa a banda para formar o Rainbow e grita aos quatro cantos que o Purple acabou. Ah Ritchie, errou feio...




Tem se início a fase mais desconhecida (e também renegada pelos fãs ardorosos do chapeludo) da banda. Após descartarem muitas opções inacreditáveis como Dave "Clem" Clempson (ex- Colosseum) escolhem o talentosíssimo garoto de 20 e poucos anos de idade, Tommy Bolin, ex- James Gang.
O quinteto, subestimado pela mídia, lança em 1975 o disco que tenho como clássico absoluto, "Come Taste the Band".
Ok ok, o disco é diferente: muito mais "funkeado", dançante, coisa que titio Blackmore desaprovava. Mas e daí? As composições, quase que integralmente assinadas pelos não fundadores, refletem personalidade, ousadia e criatividade.
A abertura fica por conta de "Comin' Home", uma pauleira de Coverdale, Bolin e Paice, direta ao ponto, que mostra que a MK IV não estava para brincadeira. Inclusive, a performance do batera em todo disco é fenomenal, com suas características "viradas" velozíssimas e uma pegada única.
Jon Lord é o menor dos destaques na obra. Talvez a característica mais agitada das canções tenha impossibilitado o mestre de mostrar suas habilidades derivadas da música clássica como em álbuns de outrora. Mas nada o impediu de chulapar o Hammond por todo o álbum. Destaque para o solo "moogeado" de 'Love Child".
O restante das pauleiras é fruto, basicamente, de um Coverdale amadurecido, mais solto, mais beberrão, mais irresponsável. O futuro vocalista do Whitesnake solta muito mais a voz em "Come Taste..." e impressiona pela criatividade em criar linhas melódicas interessantíssimas, além das letras puramente hard rock.
Em parceria com o rei do soul/funk Glenn Hughes compôs o ponto alto do disco, "You Keep On Moving", que mostra um Purple diferente mas seguro de si, através de uma canção pesada, gritada, que contudo oscila em partes suaves, cheias de alma e balanço.
Falando em alma e balanço, o ex-baixista do Trapeze simplesmente emocionou uma geração com a oitava canção da bolacha: "This Time Around/Owed to 'G'". Indescritível, a balada vai do céu da voz e baixo de Hughes até a infernal quebradeira de Paice e Bolin ao final. Simplesmente emocionante, uma das mais belas canções da história do hard rock.
Mas o destaque deste disco fica mesmo com o jovem Tommy Bolin. Apesar de malhado pelos shows, onde alterava todos os solos de Blackmore, deixou um legado de fãs com apenas um álbum no Purple. Mostrou criatividade, ousadia ao usar de acordes "estranhos" à banda e solos inesperados. Considerado por alguns como o guitarrista mais versátil depois de Hendrix, conseguia unir elementos de boogie, hard, soul, funk e psicodelia de uma maneira muito peculiar. Largava mão de abusar do virtuosismo e esbanjava sentimento. Sofreu por ter que substituir um gênio, mas para alguns tornou-se outro. Passou vergonha no final da turnê do disco, pois teve seu braço paralisado após um pico mal dado de heroína, e mal conseguia segurar a guitarra.
O abuso das drogas, todos sabem, levou ao fim do Deep Purple em 1976, e posteriormente à morte por overdose de Tommy Bolin. Uma pena, pois a quarta formação poderia ter rendido muito mais e lançado mais petardos como este.


  1. Comin' Home
  2. Lady Luck
  3. Gettin' Tighter
  4. Dealer
  5. I Need Love
  6. Drifter
  7. Love Child
  8. This Time Around / Owed to 'G'
  9. You Keep On Moving

Link para o álbum

domingo, 16 de março de 2008

INCREDIBLE HOG - Paulera Pura nos Anos 70


Bem, estreando as postagens do blog, resolvi falar um pouco sobre a subestimada banda INCREDIBLE HOG. É, provavelmente você nunca ouviu falar dessa banda, mas fique tranquilo que o problema não é com você.






Formada em 1972 na produtiva Londres, essa banda fazia um hardão daqueles! Uma pegada forte de guitarra, uma baixo grooveado e aquela bateria nervosa da época. O power-trio formado por Ken Gordon (vocal, guitarra, gaita), Jim Holmes (baixo) e Tony Awin (bateria) lançou apenas um álbum, intitulado simplesmente de Volume I, em 1973.

O que se pode ouvir nesse álbum é um hard setentista com toques bem "rock n' roll", riffs para todos os lados e uma produção extremamente crua, que dá o tempero. Os vocais de Ken Gordon muitas vezes lembram nosso amigo Ozzy Osbourne do recém famoso (à época) Black Sabbath. Mas aqui não há nada de obscuro ou terrorífico como a outra banda inglesa: O Incredible Hog não faz menção ao cramunhão e não se utiliza daquele famoso "si" do tritão. A banda toca com raiva, agressividade, mas segue a linha tradicional da hardera, com leves toques psicodélicos. Destaque para refrões ingênuos e e algumas vezes desconexos, simplesmente fantásticos. A gaita de Ken também é utilizada de maneira convincente e descontraída. Não faltou espaço para momentos mais lentos (recuso-me a utilizar a expressão "balada" para tal banda), representados pela ótima "Losing Myself". Outro ponto interessante é riff inicial de "Another Time", que nos remete diretamente ao AC/DC. No entanto, a banda australiana dos irmãos Young só iria lançar seu álbum de estréia, High Voltage, em 1975...

O Incredible Hog encerrou suas atividades aparentemente no mesmo ano de 1973, tendo feito apenas uma pequena turnê pela Inglaterra. Seu único registro é essencial para qualquer um que aprecie a "hardera setentista".




01 - Lame
02 - Wreck My Soul
03 - Execution
04 - Tadpole
05 - Another Time
06 - Warning
07 - Walk The Road
08 - There's A Man
09 - To The Sea
10 - Losing Myself

Link para o álbum (torrent)

sábado, 15 de março de 2008

Olá!

Finalmente o famigerado blog está no ar. Para começar pensei em várias coisas. Nenhuma delas vai entrar...

Meu interesse com esse blog é somente compartilhar algum conhecimento cultural (útil ou inútil) com quem tem gostos tão ou mais duvidosos que eu. Mas essa merda de chuva cheia de relâmpagos não pára...